#TBTMDQA: George Harrison, histórias árabes e "Layla", a mulher que deixou Eric Clapton de joelhos

O emblemático guitarrista Eric Clapton se inspirou em uma história árabe para fazer de "Layla" uma dolorosa história de um amor proibido.

Pattie Boyd e Eric Clapton

Alguns nomes marcaram gerações por causa de seu uso em títulos de música. Isso por ir desde “Roxanne” do The Police até a “Jude” dos Beatles. Afinal, ter seu nome associado a uma música pode ser uma das coisas mais satisfatórias da vida (ou um pesadelo). Nesse contexto, também se encaixa “Layla“, canção lançada originalmente pela banda Derek & The Dominos em 1970.

Parte integrante do disco Layla and Other Assorted Love Songs, a música foi escrita majoritariamente por Eric Clapton e se mostra até hoje um de seus maiores sucessos. Mas, afinal, quem é essa Layla? De onde surgiu e como impactou a vida de Clapton?

Trazemos essas respostas e mais algumas curiosidades sobre esse grande sucesso logo abaixo. Confira!

 

Pattie Boyd

A modelo e fotógrafa britânica Pattie Boyd é basicamente a razão pelo qual tudo aconteceu. Na época, no entanto, ela atendia pelo nome Pattie Harrison. O motivo? Simples: ela era esposa do Beatle George Harrison, que, por sinal, era grande amigo de Clapton.

A letra não esconde suas intenções, dando a entender que Pattie (a tal “Layla”) ficaria sozinha e que deveria se unir ao eu-lírico. É uma declaração angustiada, diante de um doloroso amor proibido (o que se traduz bem na potência da voz de Clapton no refrão).

Anos mais tarde, Clapton ainda dedicaria mais uma canção de seu repertório para ela: “Wonderful Tonight“, presente no disco Snowland (1977).

 

“Layla and Majnun”

Como você prontamente já deve ter percebido, o nome de Pattie não tem qualquer relação com o título do megahit sobre o qual estamos falando. Então, o que rolou?

Na época, um amigo próximo de Clapton, Ian Dallas, estava se convertendo ao islamismo e, consequentemente, se aproximando aos poucos da cultura árabe. Ele contou para o guitarrista a história de “Layla e Majnun“. Escrita pelo poeta Qays ibn al-Mullawah, obra considerada por alguns o “Romeu e Julieta” do Oriente. O personagem Majnun, que não pode se relacionar com a mulher que ama porque ela foi forçada por seu pai a se casar com outro, inspirou Clapton a criar o eu-lírico de “Layla”. Na canção, Layla também é em um patamar elevado, como se fosse uma divindade inalcançável.

 

De balada a um “rockzão”

Pense na explosiva reação de Clapton no refrão da música. Esse grito de amor, hoje, é considerado um dos melhores rocks da história, mas nem sempre a canção foi assim.

Em seus rascunhos originais, Layla era uma balada romântica e ainda não tinha conhecido a estrutura que popularizou o nome no Ocidente. Tudo mudou quando Clapton passou a colaborar com o guitarrista Duane Allman. Com o santo batendo quase que instantaneamente, a química da dupla foi responsável pela versão encorpada que tanto amamos.

O icônico riff de abertura? Allman. O solo de slide? Allman. Bom, já deu para entender que esse foi um daqueles encontros raros proporcionados pela vida, certo?

Eric Clapton e Duane Allman
Eric Clapton e Duane Allman

 

Do nada, um piano

Lá pela metade da música, “Layla” nos introduz a uma súbita peça de piano, que acalma os nervos da música e, sem vocais, nos deixa viajar pela história conta por Clapton. A ideia veio de Clapton, inspirado por uma canção do baterista Jim Gordon (não, não é comissário de Gotham).

Na época, Gordon trabalhava em um álbum solo, e uma das faixas era uma balada no piano, composta por sua então namorada Rita Coolidge. Ao ver Jim tocando, Clapton ficou impressionado e o convenceu a usar a música como uma “outro” para a música. O crédito referente a essa parte é até hoje motivo de polêmica.

 

Aprovado?

Uma vez que a música estava pronta, Eric Clapton foi mostrar o resultado final para Pattie Boyd, que relembrou o momento com precisão em sua autobiografia Wonderful Tonight: George Harrison, Eric Clapton, and Me:

Ele colocou no aparelho de som, aumentou o volume e me mostrou a música mais poderosa que já ouvi na vida. Ele reproduziu umas duas ou três vezes, enquanto me observava para ver minha reação. A primeira coisa que pensei foi ‘Meu Deus, todo mundo vai saber que é sobre mim’.

Pattie Boyd
Foto: Larry Ellis

 

Casos de família

Em 1974, Boyd se separou de Harrison e deu início a seu relacionamento com Clapton. Mas não espere uma história de raiva, ciúmes ou qualquer roteiro de filme. Boyd e o ex-Beatle continuaram amigos, assim como ele manteve sua amizade com Clapton. Harrison, por sinal, até foi ao casamento dos colegas.

O relacionamento do guitarrista com a sua “Layla” durou pouco mais de 10 anos, com um divórcio oficializando seu fim em 1989. A decisão partiu da própria Pattie e foi justificada pelo alcoolismo de seu parceiro, além de outros “affairs” do guitarrista ao longo dos anos.

 

Flopou

Layla and Other Assorted Love Songs não teve, em um primeiro momento, uma boa recepção comercial ou mesmo por parte da crítica. Na época, a banda lançou uma versão “single” da música, sem a parte do piano, e com duração aproximada de dois minutos e quarenta segundos.

A versão completa foi lançada oficialmente em 1972, em discos “compilados” de Eric Clapton (History of Eric Clapton) e Duane Allman (An Anthology). O relançamento fez com que a canção conseguisse posições mais favoráveis, apesar de sua duração nada convencional. A original, de dois minutos, não conseguiu passar da 51ª posição na Billboard Hot 100, enquanto a versão completa chegou à 10ª.

De fato, a versão completa ajuda a expressar melhor o que é construído pela música, conciliando a dor de um amor proibido com a beleza de um romance verdadeiro.

 

AQUELE acústico de respeito

Existem pessoas que estão mais familiarizadas com a versão lançada por Clapton em seu Acústico MTV, gravado em 1992. Igualmente boa, o acústico traz toda uma nova ambientação que nem os melhores arranjadores do mundo seriam capazes de conceber.

Os novos arranjos, por sinal, foram pensados por Clapton e seu colega Andy Fairweather Low, que ficou animado com a ideia por ser um grande fã de Derek and the Dominos. Algumas das características mais brilhantes da versão foram sugestões de Fairweather Low, como a ideia de cantar a canção uma oitava abaixo.

Sobre a versão, Clapton respondeu à MTV:

‘Layla’ me deixou perplexo. Eu toquei a mesma versão por todos esses anos e nunca considerei tentar reformulá-la. Muitos artistas fazem isso, sabe? Bob Dylan, por exemplo, muda tudo toda vez que ele toca. Achei que essa era outra grande oportunidade de simplesmente pegar um caminho diferente, tornando-a acústica negando todos os riffs, definitivamente. Eles teriam soado um pouco fracos nessa versão, eu acho. Então, acabou pegando um ar de jazz de alguma forma.

 

Legado

Indiscutivelmente, “Layla” é o maior sucesso da banda Derek & The Dominos, mas também permanece como um dos maiores hits de Eric Clapton em carreira solo. A famosa versão acústica é uma de suas canções mais reproduzidas em plataformas de streaming, perdendo apenas para “Cocaine“, a já citada “Wonderful Tonight” e “Tears In Heaven“.

O curador musical James Henke, do Hall da Fama do Rock N’ Roll, elegeu a versão original de “Layla” como uma das 500 músicas que moldaram o rock. A famosa lista das 500 Melhores Músicas de Todos os Tempos, lançada pela Rolling Stone em 2004, também contempla a canção, na posição 27.

 

Bônus: e o Roberto Carlos?

Bom, indo direto ao ponto, há quem encontre similaridades entre “Layla” e uma canção de Roberto Carlos. “Amor Perfeito”, que também ganhou sobrevida graças a uma versão lançada pelo grupo Babado Novo em 2004, conta com algumas projeções semelhantes à já apresentada parte de piano da música.

De fato, dependendo da versão, as tonalidades das músicas são as mesmas, ou seja, se desenvolvendo a partir de um mesmo conjunto de notas. A coincidência é interessante, mas a discussão nunca foi levantada pela parte dos músicos.

A partir de 1:26, na versão do Babado, você consegue pegar algumas similaridades.