Ainda estamos vivendo a pandemia da COVID-19 mas não dá pra negar que 2020 e 2021 tenham sido os anos mais marcantes de todo esse duro processo pelo qual passa a humanidade.
Foi ali que diversos processos surgiram, mudaram, nos impactaram e foi justamente durante esse período que o grupo carioca Bala Desejo tomou forma, lançando agora o resultado de um “encontro pandêmico” na forma da primeira parte do seu disco de estreia, Sim Sim Sim.
Mostrando que não é “vintage” apenas na sonoridade, o quarteto formado por Dora Morelenbaum, Julia Mestre, Lucas Nunes e Zé Ibarra disponibilizou o álbum como se fosse um disco de vinil, apresentando o “Lado A” ao mundo e guardando o “Lado B” para um segundo momento.
Para saber mais sobre tudo isso, conversamos com Ibarra, um dos músicos do grupo que lança o álbum pela Coala Records.
Divirta-se!
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Entrevista com Zé Ibarra, do Bala Desejo
TMDQA!: A história da banda se confunde com a pandemia, e quando o mundo se isolou, vocês encontraram formas de colaborar ao promoverem verdadeiras imersões. Conta pra gente como surgiu todo esse processo e quando foi que ele ganhou realmente forma de banda?
Zé Ibarra: Tudo começou muito lá atrás, na escola ainda, quando demos a sorte de cairmos todos praticamente na mesma turma – e não só nós 4, mas também o Tom Veloso, o Tom Karabachian e muitos outros artistas de agora estão juntos de nós desde a adolescência. Mas realmente, foi no meio da pandemia, como um meio de escape, que resolvemos ir morar juntos.
Não nos víamos ainda como uma banda, mas com o passar do tempo e com as várias lives que fizemos, foi o público que nos mostrou que poderia sair algo maior dali. A confirmação de que daquele momento em diante seríamos um grupo veio com o convite do Festival Coala para tocarmos em 2021. Já que o festival não aconteceu, por causa da pandemia, resolvemos enfim encarar a empreitada e fazer um disco juntos.
TMDQA!: O som de vocês é pra lá de nostálgico e vintage, e vocês estão lançando o “Lado A” do disco, já prevendo sua sequência e fazendo uma clara analogia aos discos de vinil. Quão importante é o resgate de outros tempos na música para vocês? E como vocês incorporam esses elementos todos com o mundo digital de 2022, as plataformas de streaming e mais?
Zé Ibarra: Então, a sonoridade do grupo é antes algo natural do que propositado. Nós quatro consumimos muito, desde pequenos, os grandes discos brasileiros da década de 70, discos de arranjo, da época em que as gravadoras tinham suas orquestras e seus arranjadores… Quando começamos a conceber o Sim Sim Sim, já sabíamos que a vontade geral era soar assim, mas não para fazer uma menção conceitual a tal momento, e sim porque gostamos do que foi feito em música naquela época. Queríamos também um disco que soasse vivo, que soasse tocado por gente. A preocupação de que esse disco pulsasse vida também nos levou a optar por uma dinâmica orgânica de produção de som: músicos ao vivo tocando e sentindo a música. Todas as faixas são tocadas ao vivo e o disco quase não tem edição. Chamamos músicos incríveis para participar e tudo se deu exatamente da forma que imaginamos: um abismo de maravilha e de emoção, a vertigem gostosa de fazer música em conjunto.
TMDQA!: Que artistas e bandas mais inspiraram as composições das canções desse projeto? Como foi trazer influências individuais e transformá-las em coletivo?
Zé Ibarra: Bom, são muitos. Caetano [Veloso], [Gilberto] Gil, Tom Jobim, Milton [Nascimento], Dorival [Caimmy], Michael Jackson, Abba, Jorge Ben, Violeta Parra, Rita Lee, Take 6, Beatles, Bob Marley, Buena Vista [Social Club], Jards [Macalé], Itamar [Assumpção] e Arrigo [Barnabé] são alguns que pensamos durante o processo de feitura do disco, mas são muitos, muitos mais. Esse disco acabou sendo uma real mistura de muita coisa.
A proposta sempre foi essa, liberdade criativa e poucos limites quanto a gêneros, formas, durações – fazer esse disco foi um gozo musical do início ao fim. As ideias vinham e colocávamos em prática, uma delícia.
TMDQA!: Uma das frases sobre o projeto que mais me chamou a atenção foi da Dora, que disse ser “uma ferramenta de abertura de caminhos, cura pelo sublime e pelo tesão de estar vivo.” A música tem esse poder todo e durante a pandemia foi comum ver as pessoas recorrendo à nostalgia e a elementos do passado, mais “confortáveis”, para passar pelos períodos de isolamento. Como vocês entendem o poder da arte em tempos pandêmicos, tanto como artistas como ouvintes e amantes das obras de outros nomes?
Zé Ibarra: A arte é fundamental nesses momentos, o contato com o belo, com o sublime, a transcendência. A arte dilui nosso ego, nos coloca fora de nós e por isso nos aproxima de quem somos de verdade. O isolamento foi cruel nesse sentido, a viagem labiríntica que cada um viveu para dentro de si não necessariamente foi algo bom, era necessário sair, ver de fora, e sem a música, o cinema, a literatura, a tarefa de aguentar a barra teria sido muito mais difícil.
Para nós foi uma dupla possibilidade de cura, pois além de consumir arte tivemos de produzir um disco, então posso dizer que o álbum Sim Sim Sim foi um remédio nas nossas vidas no meio da pandemia.
TMDQA!: Imagino que uma das maiores vontades de vocês é apresentar esse trabalho todo ao vivo, ainda mais estando intimamente ligado ao Coala. Como tem sido tocar junto em um período de perspectivas tão incertas? Vocês já prepararam o show do Coala?
Zé Ibarra: Sim, temos tocado juntos, aliás, sempre tivemos a ideia de fazer como antigamente, aquelas “temporadas de verão”, e, de certa forma, conseguimos fazer. Foram quatro shows pré-disco feitos em Sampa e no Rio, um astral total, as pessoas nem conheciam as músicas e já estavam dançando sem parar. O disco Sim Sim Sim foi feito para ser executado ao vivo, tudo que nele há foi pensado para funcionar ao vivo, dos arranjos às falas, à parte cênica, então não podemos esperar para estar nos palcos do Brasil afora.
TMDQA!: De onde veio a ideia para o nome Bala Desejo? Como ele se conecta com a identidade sonora e estética da banda?
Zé Ibarra: O nome surgiu na primeiríssima tarde em que nos reunimos para tentar compor alguma coisa pro disco. Nessa tarde saíram as primeiras melodias de “Recarnaval” e umas outras ideias de brincadeira, uma delas dizia: “prova do meu beijo, baba no meu queixo, bala desejo”. Não sabíamos mas aí já estava presente o que seria o conceito fundamental do álbum inteiro: o desejo, o corpo, a dança e o tesão. Quando, muito tempo depois, começamos a pensar no nome, lembramos desse verso e ele fez mais sentido do que nunca.
TMDQA!: O que podemos esperar para esse “Lado B” agora que podemos ouvir a primeira parte do disco?
Zé Ibarra: O Lado B é como se fosse as costas do Lado A. É a continuação narrativa do disco, porém com o universo subjetivo quase que oposto. Enquanto o Lado A conversa mais com o desbunde, com a festa, o Lado B é mais calmo, introspectivo e reflexivo.
Você pode ouvir Sim Sim Sim em todas as plataformas de streaming.