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Crítica: "Belfast" visita a infância do diretor Kenneth Branagh com uma história simples e bela

Destaque nos festivais internacionais, Belfast se passa na cidade homônima, na Irlanda do Norte dos anos 1960, onde o diretor nasceu e cresceu. Destaque para o estreante Jude Hill

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Foto: Reprodução

A temporada de premiações mundo afora costuma eleger favoritos na corrida que culmina no Oscar e Belfast foi um dos principais destaques em 2021. Apesar de estrear apenas em março de 2022 no Brasil, o filme se deu muito bem no ano passado, especialmente no Festival de Toronto, onde ganhou o prêmio principal.

No entanto, há um contraste curioso entre a expectativa que se criou em torno da produção e o que ela realmente entrega. Apesar de ser um ótimo filme e proporcionar uma experiência gostosa ao espectador, Belfast não atinge todo o hype criado após o desempenho no circuito.

É um sentimento agridoce ao sair da sessão: tem cara de Oscar, fala como filme de Oscar, anda como filme de Oscar, mas não é exatamente a melhor opção para Melhor Filme no Oscar.

Um pouco de Buddy, um pouco de Kenneth

O diretor Kenneth Branagh conta uma história com toques autobiográficos, a começar pela localização: o filme se passa em Belfast, cidade onde ele nasceu e cresceu, na década de 1960. A narrativa parte do ponto de vista de Buddy, um menino de apenas nove anos de idade que vive todas as experiências que se espera para um criança dessa idade, mas vai descobrindo do seu próprio jeito o que é o período que ficou conhecido como The Troubles, marcado pelo conflito armado entre protestantes e católicos que tomaram as ruas de toda a Irlanda do Norte.

As principais referências de Buddy são os pais e os avós, personagens sem nome que são os grandes modelos para o garoto. A Mãe, interpretada por Caitriona Balfe (Outlander), é uma mulher charmosa, querida por todos, mas sobrecarregada por ter que criar dois filhos com pouca participação do Pai, vivido por Jamie Dornan (Cinquenta Tons de Cinza). Ele trabalha em Londres com empregos temporários para pagar as contas da família e, apesar de tentar fazer o melhor pelos filhos, está presente apenas em alguns fins de semana.

Ao filmar os pais de baixo para cima (o famoso contra-plongeé) e por ângulos “escondidos”, Branagh dá a eles o semblante de autoridade que é normal considerando que o protagonista ainda é uma criança. Eles estão sempre impecáveis, são bonitos e carismáticos, basicamente o conceito de perfeição aos olhos do caçula da família.

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Foto: Reprodução

A identificação com a história contada a partir dos olhos do garotinho pode ter favorecido até mesmo os demais integrantes do elenco. Caitriona domina todas as cenas nas quais aparece como uma mulher forte, que se propõe a ser uma referência para os filhos, mas que também está no limite por criar duas crianças praticamente sozinha.

Já Dornan é um pai que parece imaculado, mas tem muitas camadas escondidas por essa suposta perfeição. Para a esposa e para o lar em si, a ausência e decisões erradas têm um peso muito grande e invisível para o protagonista mirim. No meio disso tudo, o ator se distancia cada vez mais do estereótipo de macho-dominador-sedutor conquistado quando estrelou Cinquenta Tons de Cinza, o que é um passo importante na sua carreira.

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Irlanda do Norte ou México?

Belfast será exaustivamente comparado a Roma (2018) devido à fotografia em preto e branco e ao caráter biográfico do filme (Alfonso Cuarón também pegou emprestado aspectos da sua infância no México para construir seu filme), mas não passa disso.

A Belfast incendiada pelos conflitos religiosos no final da década de 1960 é retratada de uma forma bem mais superficial que o bairro da Cidade do México no qual Cuarón conta sua história. Branagh não se aprofunda no contexto no qual estão inseridos os protagonistas e, principalmente, não o utiliza como crítica social.

Na verdade, o diretor norte-irlandês apenas conta a história de uma família e como ela pretende se adaptar à nova realidade do país, mostrando toda a situação a partir de uma perspectiva infantil. Apesar de parecer rasa, esta escolha apenas transfere a profundidade para um ponto que é mais fácil de qualquer pessoa se identificar, que é a juventude.

Acompanhar Buddy é um exercício fácil, divertido e, vez ou outra, emocionante. Ele tem a fofura do ator Jude Hill a seu favor e é impressionante o desempenho do jovem estreante. Ele transita entre o garotinho interessado pela colega de sala, o aventureiro com os amigos da rua, o birrento quando contrariado, o admirador do pai, o apaixonado pelos ensinamentos do avô… Kenneth Branagh não teve medo de colocá-lo em todas essas situações e enfatizar essas expressões por meio de closes muito caprichados.

A fotografia em preto e branco não é exatamente necessária, mas, uma vez que é extremamente bem feita, realça esses momentos muito bonitos do protagonista.

A tal nostalgia

Kenneth Branagh imprime no filme um olhar nostálgico, como se mirasse na Belfast pré-conflitos e desejasse constantemente que ela voltasse a existir.

O mesmo sentimento de saudade é transmitido pelos incríveis diálogos do Avô (Ciarán Hinds) com o neto, pela presença carinhosa da Avó (Judi Dench) e pelos hobbies do jovem Buddy, como ir ao cinema com a família.

É como se todos os espectadores estivessem revivendo suas próprias experiências familiares enquanto Buddy aprende com os seus maiores exemplos e constrói suas memórias mais felizes.

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Foto: Reprodução

Belfast desafia o público a confrontar os rótulos que prêmios importantes costumam colocar nos filmes que chegam ao Oscar. Não é necessário ser o melhor para ser bom e não é sempre que a fórmula do “filme de premiação” vai criar obras-primas.

É possível consumir entretenimento bem feito descendo um degrau de exigência.

Confira o trailer de Belfast: